Uma fiel da Igreja Universal do Reino de Deus doou parte do prêmio de R$ 1,8 milhão que o ex-marido ganhou na Lotofácil, mas se arrependeu oito anos depois.
A mulher pediu o dinheiro de volta, porque não obteve as “bênçãos financeiras” que esperava como retorno da doação.O caso acabou indo parar no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). A autora do processo, Sônia Maria Lopes, disse que frequentava a denominação com o marido desde 2006, na esperança de “alcançar sucesso financeiro, profissional e familiar”.
Na época, o marido trabalhava como gari e contribuía mensalmente com 10% do salário para “obter graças divinas”.
O marido da fiel ganhou R$ 1,8 milhão na Lotofácil no ano de 2014. A primeira atitude dele foi transferir o dízimo para a igreja, que correspondeu a R$ 182,1 mil e, depois, doou mais R$ 200 mil, “com a promessa de que sua vida seria abençoada”. Em 2015, o casal se separou e dividiu o que sobrou do prêmio.Após a separação, Sônia decidiu fazer mais doações à igreja. Ela transferiu um Hyundai HB20 e mais R$ 101 mil em dinheiro. A fiel disse, no processo, que fez as doações porque estava “na busca das bênçãos financeiras”.
Após oito anos, a mulher não se sentiu abençoada e deixou de frequentar a Igreja Universal por não ter “alcançado o ápice prometido nas pregações”.
Justiça manda igreja devolver
Na última segunda-feira (28), o juiz Gustavo Fernandes Sales, da 1ª Vara Cível de Samambaia, anulou a doação de R$ 101 mil realizada pela mulher e condenou a Igreja Universal a devolver o dinheiro, com correção monetária e juros. No entanto, ele rejeitou o pedido para restituição do carro.
Na decisão, o magistrado escreveu que a doação em dinheiro deveria ter sido formalizada por escritura pública ou instrumento particular. “Como se trata de oferta de alta monta, não há como dispensar o preenchimento do requisito legal”, afirmou.
Para Sales, a afirmação da fiel de que foi “ludibriada pela igreja ao não receber as bênçãos prometidas” não pode ser usada como base do pedido de nulidade da doação.
Versão da igreja
A Universal disse à Justiça que Sônia fez as doações “nos limites das liberdades de consciência e de crença”. De acordo com a denominação, o arrependimento, descrença ou abandono da convicção religiosa não torna ilícita a conduta da igreja.
O UNIcom, Departamento de Comunicação Social e de Relações Institucionais da Universal, disse em nota que a “sentença divulgada hoje não questiona a doação efetuada à Igreja Universal do Reino de Deus, ou a motivação da doadora, nem aponta qualquer tipo de coação.”A igreja também alegou que “a decisão judicial apenas estipula que, na visão do magistrado, em razão do valor envolvido, a doação deveria ter sido efetivada por intermédio de um instrumento público”.“Reiteramos que Universal faz seus pedidos de oferta de acordo com a lei, exercendo seu direito de culto e liturgia, assegurados pela Constituição Federal. Em um país laico, como o Brasil, não é possível qualquer tipo de intervenção do Estado — incluindo o Poder Judiciário — na relação de um fiel com sua Igreja.”